TEXTO CURATORIAL

A exposição RETRATISTAS DO MORRO reúne imagens pertencentes à história recente da fotografia brasileira produzidas pelos fotógrafos João Mendes e Afonso Pimenta, que trabalham, desde a década de 1970, registrando o cotidiano dos moradores da Comunidade do Aglomerado da Serra, segunda maior favela do país, localizada na cidade de Belo Horizonte.

A comunidade, em que moram mais de 70.000 pessoas, é resultado da expansão populacional e territorial de vilas menores que foram surgindo na encosta da Serra do Curral, a partir de 1914, ainda como solução para muitas famílias que vieram do interior colaborar na construção da capital mineira ou à procura de emprego, sem ter onde morar.

As fotografias de João e Afonso nos revelam outras versões da história das metrópoles e das populações de favela no Brasil, contadas a partir das experiências e visões de mundo de seus próprios moradores. Representam suas trajetórias de vida, lutas e conquistas.

Em meio a gestos fotográficos quase despretensiosos, voltados para o registro de uma realidade familiar e seus movimentos cotidianos, acompanhando intimamente o acontecimento de casamentos, nascimentos, batizados, jogos de futebol, velórios, formaturas e bailes, eles construíram uma iconografia inédita, das poucas ainda preservadas, em que é possível acessar por meio da imagem mudanças nos cenários social, político, econômico e cultural, ocorridas nas favelas do Brasil, ao longo dos últimos quase 50 anos.

A obra desses retratistas tradicionais está integralmente dedicada ao que é importante ao Outro. Apesar das características formais, não é uma obra documental, mas biográfica. Trabalham onde vivem. Estão entre seus pares, amigos e parentes.

Diante da desigualdade simbólica ou de representação pela visualidade tão acentuada quanto a social, como acontece em nosso país, encontraram espaço para registrar as memórias e vivências afetivas de toda uma população. Apresentam em suas fotografias uma realidade em que todos temos o direito igual de existir e manifestar nossas subjetividades.

Guilherme Cunha

Curador