Emanoel Araújo: arte e combate ao racismo

O atual diretor executivo e curatorial do Museu Afro Brasil (MAB), Emanoel Araújo, tem uma carreira que perpassa todo o sistema das artes. Nascido em 1940, em Santo Amaro da Purificação (BA), começa sua carreira nas artes em 1959 e, desde então, transita por vários caminhos nesse sistema como: gestor de grandes equipamentos culturais nos Estados de São Paulo e da Bahia, professor, colecionador de obras de arte africanas, escritor de livros sobre arte, teatrólogo, curador, editor, pesquisador. Isso sempre tendo como escopo principal de atuação o combate ao racismo e a valorização da história da arte afrodescendente brasileira e da arte africana.

Como gestor cultural experiente em São Paulo, destaca-se o fato de ter sido diretor da Pinacoteca do Estado de São Paulo por dez anos (1992-2002), equipamento cultural que, em sua gestão, mudou sua política de aquisição de obras, passando a ter em seus acervos obras de artistas contemporâneos afrodescendentes, além de providenciar uma reforma do espaço físico, o que possibilitou a realização de grandes exposições de arte. Em relação às mostras marcantes desse recomeço da Instituição, destaca-se a exposição “Vozes da Diáspora”, as comemorações do centenário de Mário de Andrade e os cento e cinquenta anos de Marc Ferrez.

Como idealizador do MAB e único diretor executivo e curatorial desde 2003, Emanoel Araújo pensou uma instituição que se dedicasse à memória do afrodescendente e às contribuições desses artistas para a arte brasileira. Como artista visual, Emanoel Araújo concebeu obras a partir de múltiplas linguagens. Mais conhecido como escultor, desenvolveu também uma ampla produção em desenho, gravura e outras linguagens.

Conhecido por suas obras tridimensionais, geométricas e de cores vivas, é notabilizado por obras com tamanhos e formatos variados. Dentre suas obras tridimensionais, várias podem ser catalogadas como construtivistas. Outra característica marcante nas obras de Emanoel Araújo é a diversidade de materiais, passando pelo uso de diferentes madeiras e metais, e de técnicas.

Figura 1: “Máscara”, Emanoel Araújo, 1976. Foto: Romulo Fialdini. Fonte: Enciclópedia Itaú Cultural.

A obra “Máscara” é uma construção geometrizada em madeira (pinho-de-riga). Em seu centro, observa-se uma fenda no formato de losango com características muito semelhantes aos olhos das máscaras do povo Tchokwe, originário de Angola, e das máscaras Gueledé, do povo Iorubá. É importante lembrar que a geometrização é uma característica dos grafismos de vários povos africanos.

“Bicho alado”, outra obra geometrizada de Emanoel, é uma grande peça de aço pintada de preto em que se pode observar uma pirâmide e um prisma arranjado em formas opostas, o que sugere um pássaro. Essa escultura, mesmo com grande porte e peso, transmite uma sensação de leveza.

Figura 2: “Bicho alado”, Emanoel Araújo, 1980. Foto: João Musa. Fonte: site do MASP.

A obra “A aranha”, pertencente ao Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP), está instalada no Parque do Ibirapuera, onde se encontra o Museu. É uma obra tridimensional com características duplas, pois ao mesmo tempo em que é geometrizada é também uma representação infantilizada de uma aranha, com quatro patas e não oito, como o animal real. A aranha de Emanuel dialoga diretamente com a natureza, com os prédios e com os brinquedos do parque. Por causa das quatro patas e de uma de suas partes em vermelho que lembra uma tromba, não é incomum crianças acharem que se trata de um elefante em vez de uma aranha.

Figura 3: “A aranha”, Emanoel Araújo, 1981. Foto: Dornicke. Fonte: Wikipédia.

“O navio”, outro trabalho do artista, é uma obra que em uma rápida observação se assemelha a um totem, contudo, é uma representação de um navio negreiro. A obra em madeira pintada de preto traz um losango que remete a um barco com pequenas figuras humanas, simbolizando africanos sequestrados para o trabalho escravo nas Américas. Do centro da obra surge uma corrente, símbolo de repressão, tortura e cativeiro, que se conecta a uma cruz católica com um Jesus Cristo crucificado, deixando clara a conexão entre a escravidão e o cristianismo na colonização das Américas.

Figura 4: “O navio”, Emanoel Araújo, 2007. Foto sem autoria. Fonte: site do MASP.

Em sessenta e dois anos de carreira artística, Emanoel Araújo percorreu diversos papéis possíveis de um artista desempenhar dentro do campo das artes, sempre pensando na coletividade e na ancestralidade africana do Brasil. Uma palavra que poderia definir sua conduta enquanto artista, curador e gestor público é a generosidade, já que é também um grande doador de obras de arte para as instituições. Tanto o MASP (Museu de Arte de São Paulo), o MAM, o MAB e a Pinacoteca do Estado, quanto outras instituições de arte, receberam doações de obras de Emanoel Araújo ou obras compradas por ele em suas viagens de pesquisa à África.

Referências:

Imagens

Figura 1 e Ilustrativa: ARAÚJO, Emanoel. Máscara. Relevo em pinho de riga e madeira pintada, 120 cm x 160 cm, 1976. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2021. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra20903/mascara>. Acesso em: 11 de Mai. 2021. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7

Figura 2: ARAÚJO, Emanoel. Bicho alado, dimensões 260 x 220 x 60 cm, escultura em aço carbono, acervo MASP, 1980. Fotografia João Musa. Disponível em: <https://masp.org.br/acervo/obra/bicho-alado>. Acesso em: 11 de Mai. 2021.

Figura 3: ARAÚJO, Emanoel. Aranha, Técnica: Escultura, [S.D.], Acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo, Brasil, 1981. Fotografia Dornicke. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Emanoel_Ara%C3%BAjo_-_Aranha,_1981.JPG#metadata>. Acesso em: 11 de Mai. 2021.

Figura 4: ARAÚJO, Emanoel. O navio, Escultura, 220 x 80 x 19 cm, Acervo MASP, 2007. Disponível em: <https://masp.org.br/acervo/obra/o-navio>. Fotos sem autoria. Acesso em: 11 de Mai. 2021.

Textos

ARAÚJO, Emanoel. Museu Afro Brasil – um conceito em perspectiva.Disponível em: <http://www.museuafrobrasil.org.br/o-museu/um-conceito-em-perspectiva>. Acesso em: 25 de set. 2017.

CONDURU, Roberto. Arte Afro-brasileira. Belo Horizonte: C/Arte, 2007.

LODY, Raul. Dicionário de Arte Sacra & Técnicas Afro-brasileiras. Rio de Janeiro: Pallas, 2003.

MATTOS, Regiane Augusto de. História e cultura afro-brasileira. São Paulo: Contexto, 2016.

Vídeos

ÁFRICA contemporânea com Emanoel Araújo, 2015. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=36dLfoTv6iE>. Acesso em: 11 de Mai. 2021.

ARTES Visuais: Emanoel Araújo. SescTV. Publicado em 28 de jan de 2013. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=bJc2BpVXFrc>. Acesso em: 11 de Mai. 2021.

EMANOEL Araújo, 2008. Disponível em:<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa662/emanoel-araujo>. Acesso em: 11 de Mai. 2021.

NATUREZA geométrica – Emanoel Araújo. Design Weekend 2015. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=7DE9VXSdFLM>. Acesso em: 11 de Mai. 2021.

RODA VIVA. Emanoel Araújo -20/11/2006.Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=yJ-LrNiuzEA>. Acesso em: 11 de Mai. 2021.

______. Emanoel Araújo -18/12/2017.Disponível em: <http://tvcultura.com.br/videos/63725_roda-viva-emanoel-araujo-18-12-2017.html>. Acesso em: 11 de Mai. 2021.

Sobre o autor:

Alexandre Ventura é professor de História da Arte no Cefart – FCS, graduado em História pela UFMG e mestre em História Social pela PUC-SP.