História da Arte e Modernismo no Brasil – Caso do “desaparecimento” de Zina Aita

Quando pensamos em arte moderna de primeira geração em Minas Gerais, nos vêm à mente os grandes poetas e escritores mineiros. Contudo, uma jovem pintora contribuiu decisivamente para as artes visuais no Brasil.

Conheça Zina Aita, pintora nascida em Belo Horizonte, que foi decisiva no modernismo brasileiro e destaque na Semana de Arte Moderna de 1922!

Toda vez que pesquisamos sobre mulheres nas artes visuais, que militaram no modernismo no início do século XX, aparecem dois nomes – Anita Malfatti (1889-1964) e Tarsila do Amaral (1886-1973) – como grandes protagonistas do cenário das artes plásticas modernas no Brasil. Contudo, há outro nome muito importante da mesma época, de uma mulher mais jovem que suas colegas, nascida em Belo Horizonte, que passou parte da infância na cidade italiana de Nápoles, tendo uma importância muito significativa nos primeiros anos da pintura modernista no Brasil. O nome civil é Tereza Aita (1900-1967), o apelido é Zina Aita. Ao longo da vida, Zina Aita trabalhou com várias linguagens e técnicas: óleo sobre tela, aquarelas, tapeçaria, cerâmica e desenho. Sua formação aconteceu na Itália, mais propriamente em Roma, Florença e Veneza. Mas foi com uma exposição individual realizada no Rio de Janeiro, e também em Belo Horizonte, em 1920, que a artista entrou para o circuito modernista brasileiro.

A exposição em Belo Horizonte foi considerada o primeiro e incipiente impulso de arte moderna em Minas Gerais, bem antes dos poemas de Carlos Drummond de Andrade ganharem notoriedade. Zina Aita também estabelece contatos com os grandes artistas da cena modernista paulista e carioca muito antes dos jovens escritores da Rua da Bahia. Os pesquisadores mostram que havia laços de amizade entre a artista e Manuel Bandeira, Mário de Andrade e Anita Malfatti.

A prova mais cabal da sua importância é a participação na Semana de Arte Moderna, realizada em fevereiro de 1922, no Teatro Municipal de São Paulo, com oito obras. Também é aqui que se percebe a dificuldade de encontrar um registro visual dessa artista: em todos os sites, teses e artigos consultados é possível encontrar apenas dezenove obras de autoria de Zina Aita, sendo que dezoito delas localizam-se no blog do Luiz Almeida. Dessas dezenove obras, apenas uma, “Homens Trabalhando” ou “A Sombra”, foi listada no programa da Semana de Arte Moderna. Após o evento modernista, Zina Aita faz uma exposição individual em São Paulo com repercussão e venda significativas. De acordo com o Guia das Artes, portal de conteúdo especializado em artes, a artista “nessa época realiza ilustrações para a revista Klaxon, publicação dos modernistas paulistas. Sua produção permanece pouco conhecida, e grande parte de suas obras não é datada. Para alguns estudiosos, sua pintura desse período aproxima-se do movimento art nouveau e do pós-impressionismo”.

Em 1924, Zina Aita volta à Itália, assume os negócios de cerâmica da família e perde o contato paulatino com a cena artística mineira e brasileira. A última exposição a celebrar sua obra foi “Jeanne Milde, Zina Aita: 90 anos”, realizada em 1990, portanto, há trinta anos. Concebida para comemorar os 90 anos de nascimento da artista, a exposição foi realizada no Museu de Arte da Pampulha (MAP), vinte e três anos após o seu falecimento.

Impressões sobre as obras

 

Ao observarmos a obra “Homens Trabalhando”, percebe-se que essa tela com um azul vibrante de Zina Aita antecipa tema muito recorrente nas pinturas modernistas: dar visibilidade ao trabalho duro da população negra e mestiça brasileira. Na tela há uma projeção de sete sombras azuis, retorcidas e disformes, dos corpos dos seis trabalhadores e de um prédio. É uma obra de inclinação pós-impressionista ou fauvista. Segundo Aracy Amaral, em “Artes plásticas na Semana de 22”, essa obra teve uma receptividade bem grande por parte do público da Semana de Arte Moderna.

 

Homens Trabalhando (A Sombra)

 

Em outra obra, “Jardineiro”, Zina Aita repete o azul vibrante e aborda em destaque retratos de várias etnias, um tema bem consonante com as pinturas de Anita Malfatti. Dessa vez a artista retrata um homem, mestiço, com um componente de sedução contido no tronco desnudo, com parte das costas à mostra e um buquê de flores nos braços. Nessa obra há um apego à proporcionalidade do corpo.

 

Jardineiro (Mulato)

 

É estranho perceber que, apesar de a produção da artista não ter diminuído com o tempo, pelo contrário, ter se diversificado, expandindo temas, técnicas e suportes, mesmo assim os laços artísticos com Minas Gerais diminuíram bastante. Em 1944, durante a gestão do prefeito Juscelino Kubitschek, por exemplo, a estética modernista foi incorporada por um discurso político modernizador da arquitetura da capital, com a construção do conjunto arquitetônico da Pampulha. Nesse contexto, destaca-se a criação do Instituto de Belas Artes, em que não há menção ao nome da artista.

Percebe-se que Zina Aita traçou outros caminhos para sua carreira, mas o que assusta é o fato do seu nome circular apenas em um pequeno grupo de acadêmicos, mesmo as suas obras pertencendo a grandes coleções particulares.

 

 

Alexandre Ventura é professor de História da Arte no Cefart – FCS, graduado em História pela UFMG e mestre em História Social pela PUC-SP.

 

Referências Bibliográficas:

Imagens

Figura 1 – Autora: Zina Aita. Homens Trabalhando (a sombra) 1922. Óleo sobre tela, 22.00 cm x 29.00 cm, Acervo: Yan de Almeida Prado.

In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2020. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra11638/homens-trabalhando>. Acesso em: 30 de abr. 2020. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7

Figura 2 – Autora: Zina Aita. JARDINEIRO [Mulato] 1922 .Óleo sobre tela, 1945, 66.00 cm x 48.00 cm In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2020. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra11639/jardineiro-mulato>. Acesso em: 30 de abr. 2020. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7

 

Blogs

ALMEIDA, LUIZ. Zina Aita: modernista mineira esquecida. Página criada em: 24/02/2008 e atualizada em novembro de 2017. <http://literalmeida.blogspot.com/2008/02/zina-aita-modernista-mineira-esquecida.html>

ZINA AITA. Guia das Artes. Acesso 30/04/2020. <https://www.guiadasartes.com.br/zina-aita/imagens>

 

Textos

AMARAL, Aracy A. Artes plásticas na Semana de 22. São Paulo: Perspectiva, 1972.

RODRIGUES, Wladimir Wagner. As mulheres de Klaxon: o universo feminino a partir dos modernistas. São Paulo: o Instituto de Artes da UNESP, 2010 (tese de Doutorado- mimeo).

VIEIRA, Ivone Luzia. Vanguarda Modernista nas Artes Plásticas: Zina Aita e Pedro Nava nas Minas Gerais da década de 20. São Paulo: ECA-USP, 1994. (Tese de Doutorado)

VIVAS, Rodrigo. Por uma História da Arte em Belo Horizonte: artistas, exposições e salões de arte. Belo Horizonte: C/Arte, 2012.

ZINA AITA. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2020. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa24597/zina-aita>. Acesso em: 30 de abr. 2020. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7.

 

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