Nighthawks, de Hopper: A solidão e o isolamento da cidade

 

“Se você pudesse dizer em palavras, não haveria razão para a pintura.”
Edward Hopper

Edward Hopper, artista americano nascido em 1822 em Nova York, soube refletir, através de suas telas, o sentimento de isolamento e solidão que tem tido destaque, tanto neste momento de quarentena por causa da pandemia da Covid-19, quanto pela angústia causada no homem moderno desde o advento da Revolução Industrial. Mais recentemente, a Internet e o uso incessante de aparelhos celulares para substituir a comunicação oral e presencial entre as pessoas, a troca de afeto pelo toque e uma conversa olho no olho, têm se mostrado incentivadores da solidão na contemporaneidade.

Hopper demonstrou talento para o desenho desde os 5 anos de idade. Em 1889, após o ensino médio, ele entrou para uma escola de ilustração e no ano seguinte se transferiu para a Escola de Artes de Nova York. Na casa onde ele nasceu, funciona hoje um centro cultural com o seu nome. Ele era um sujeito de hábitos pacatos e muito silencioso. O silêncio é um elemento potente e dramático em suas pinturas em que, a maioria delas, retrata cenários das cidades modernas como restaurantes, lojas, estacionamentos e quartos de hotéis. As letras e marcas são também elementos constantes em suas obras, reverenciando o cotidiano americano repleto de ícones da cultura capitalista como letreiros de estabelecimentos comerciais. As personagens são parte da cena, mas possuem olhares vazios, semblantes que demonstram alienação ao restante da composição, “um olhar para dentro”, angustiado. Um tema recorrente em suas pinturas é a solidão, as figuras parecem insignificantes, imersas nos cenários arquitetônicos onde as casas são como uma estrutura de separação entre a natureza e a civilização.

Nighthawks, pintura de 1942, é de um período complicado na América, pois havia ocorrido o ataque militar do serviço aéreo da marinha japonesa na base naval de Pearl Harbor nos Estados Unidos, o que marcou a entrada do país na Segunda Guerra Mundial, gerando receio e instabilidade. Nessa obra há uma busca pela transição entre interior e exterior, luzes e sombras identificadas pela presença da transparência do vidro. A figuração humana tem pouquíssima expressão, os gestos são contidos, é quase um elemento de uma natureza morta. Em Nighthawks somos voyers, vigiamos os personagens e somos convidados a criar narrativas como por exemplo: O que será que estão fazendo ali? Será que se conhecem? Seria um casal? Eles não se olham, as mãos estão próximas, mas não se tocam, estariam em uma crise de relacionamento? O homem de costas estaria prestando atenção neles?

Nighthawks, Edward Hopper, 1942.

A visão panorâmica é criada pelas linhas paralelas ou oblíquas, o que desnorteia a leitura do espectador. O restaurante não é uma reprodução fiel de um estabelecimento real, mas um amálgama de referências de lugares da cidade onde Hopper vivia. É uma pintura enorme, de 84cmx152cm e foi vendida no mesmo ano de sua execução para o diretor do Art Institute of Chicago onde lá permanece até hoje.

Sobre a obra Hopper disse: “Parece ser a maneira como eu penso uma rua à noite. Eu não a vi, particularmente, como solitária. Eu simplifiquei muito a cena e fiz o restaurante maior. Inconscientemente, provavelmente, eu estava pintando a solidão de uma cidade grande”. Edward Hopper faleceu em 1967, no seu ateliê.

Isa Carolina é especialista em História da Arte, mediadora cultural e professora na Escola de Artes Visuais do Cefart – FCS.