Objetos e memórias nos trabalhos de Marcone Moreira

Cada artista tem e busca aprimorar seus próprios processos de criação, investigando materiais, técnicas e conceitos. Estão sempre explorando novas formas de criar arte e na contemporaneidade muitos buscam estabelecer conexões com a vida cotidiana. A experimentação de materiais e linguagens híbridas gera trabalhos carregados de significados que vão além da materialidade das obras. Os objetos artísticos podem estar carregados de memórias, que muitas vezes estão impregnadas nos materiais, marcados pelo uso cotidiano. Os deslocamentos desses objetos para o campo das artes e as formas como eles são apresentados propiciam experiências diversas, nos mostrando que a arte pode estar em qualquer lugar, sendo parte do nosso dia a dia.

Marcone Moreira, artista natural da cidade de Pio XII, no estado do Maranhão, trabalha com diversas linguagens: pintura, desenho, escultura, vídeo, objeto, fotografia e instalação. Sua produção artística busca relações entre os materiais já gastos pelo tempo – como embarcações e carrocerias de caminhão – e as memórias a eles relacionadas, como as culturas das comunidades em que estão inseridos. O trabalho de Marcone passa por deslocamentos e ressignificações por meio de apropriações. A expressão “apropriação” é utilizada para designar a introdução de objetos não artísticos no campo das artes. É uma prática já realizada por artistas como Pablo Picasso, Georges Braque e Marcel Duchamp no início do século XX.

Marcone valoriza muito o processo para a criação de seus trabalhos, o envolvimento com as pessoas, suas histórias e as memórias dos objetos. Em muitas de suas produções podemos encontrar relações com a linguagem da pintura, mas uma pintura que se processa não por suas próprias mãos, pois as camadas de cores encontradas nas obras já pertencem aos objetos apropriados pelo artista. Sobre esse processo, o crítico Moacir dos Anjos diz: “Em vez do que se usualmente se chama de pintura, portanto, são procedimentos de apropriação e justaposição de objetos ou de suas partes que orientam sua prática criativa, mesmo que a partir de um olhar carregado de interesse sobre o que está ali pintado ou tingido”.

O gesto do artista em escolher, apropriar e ressignificar os objetos provoca o olhar do espectador a buscar nos vestígios do tempo, nas marcas do trabalho braçal de anônimos e de pessoas que o artista conheceu, novas formas de ver e olhar a materialidade de cada elemento compositivo da obra. A imaginação, memória e a experiência com cores, linhas e formas vão além do visual, pois cada objeto carrega em si muitas estórias e sempre que acontece um novo deslocamento ele ganha novos significados. Como diz Moacir dos Anjos: “Talvez o que primeiro se perceba nos trabalhos do artista seja o convívio ativo de referências culturais dessemelhantes. É bem possível que esta seja também a impressão que mais perdure na memória de quem os encontra em situações diversas […]”.

Observe a seguir alguns trabalhos do artista.

Eles remetem você a alguma memória? Observe que os elementos visuais, cores, formas e linhas das obras são também resultado do desgaste do tempo e do uso em ofícios diversos. Além disso, existem algumas intervenções do artista na composição de partes diferentes do mesmo objeto.

Figura 1: “Série Páginas”, Marcone Moreira, madeira de embarcação, 52x73cm, 2017. Fonte: Catálogo da exposição “Linhas de Força”, FCS
Figura 2: “Série Modular”, Marcone Moreira, madeira de embarcação, 240x198cm, 2016. Fonte: Catálogo da exposição “Linhas de Força”, FCS
Figura 3: “Série Páginas”, Marcone Moreira, madeira de embarcação, 40x62cm, 2017. Fonte: Catálogo da exposição “Linhas de Força”, FCS
Figura 4: “Similares”, Marcone Moreira, madeira de carroceria e nylon, 40x66cm, 2004. Fonte: site do Prêmio Pipa 
Figura 5: “Fêmea”, Marcone Moreira, madeira, 180x150cm, 2005. Fonte: site do Itaú Cultural

Curiosidade:

Em 2018, o artista realizou a mostra “Linhas de Força” na Galeria Arlinda Corrêa Lima, no Palácio das Artes, Fundação Clóvis Salgado (FCS). A exposição apresentou trabalhos em diversas linguagens, como desenho, objetos, esculturas e instalações. O acervo da FCS abriga uma obra de Marcone, que também foi apresentada na exposição “Acervo FCS – Objetos” em 2019, na qual foram expostos trabalhos tridimensionais de diversos artistas com obras no acervo da Fundação.

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Referências:    

MOREIRA, Marcone. Linhas de força / Marcone Moreira. Belo Horizonte: Fundação Clóvis Salgado, 2018. Artes visuais – Catálogos – Exposições. Fundação Clóvis Salgado.

Marcone Moreira. Disponível em: <https://www.premiopipa.com/pag/20253-2/>. Acesso em: 11 nov. 2022.

APROPRIAÇÃO. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2022. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo3182/apropriacao>. Acesso em: 03 nov. 2022.

Sobre o autor:

Giovane Diniz é licenciado em Artes Plásticas, mestre em Artes Visuais, artista plástico, professor e mediador cultural na Escola de Artes Visuais do Cefart – FCS.