Retratistas do Morro

A exposição Retratistas do Morro, que esteve aberta à visitação na CâmeraSete – Casa da Fotografia de Minas Gerais desde o dia 14 de fevereiro de 2020 até o provisório fechamento das instituições culturais em virtude da pandemia de Coronavírus, ganha uma versão on-line, a partir do dia 1º de setembro, no site da Fundação Clóvis Salgado. A mostra tem a curadoria do artista visual, pesquisador e empreendedor cultural Guilherme Cunha e reúne imagens pertencentes à história recente da fotografia brasileira, produzidas pelos fotógrafos João Mendes e Afonso Pimenta, que, desde a década de 1970, registram o cotidiano dos moradores da Comunidade do Aglomerado da Serra, segunda maior favela do país, localizada em Belo Horizonte.

Partindo de uma visão dos próprios moradores da Comunidade, a coletânea de fotos de João e Afonso traz um perfil da região e de seus habitantes, seus costumes e o dia a dia captado por suas lentes que fazem um trabalho quase autobiográfico, já que são, também, moradores do Aglomerado da Serra. Suas fotografias registram movimentos naturais da vida, momentos de despedidas e encontros, de início e final de ciclos, tais como casamentos, formaturas, bailes e velórios. Esses registros mostram um panorama social e as transformações ocorridas na favela ao longo dos anos.

Foto: João Mendes. Fonte: Site FCS.

As fotografias de João, selecionadas para a exposição na CâmeraSete, vão de 1975 a 1979, e ele registra, em formato 3×4, formaturas de crianças do ensino público em períodos diversos. Já as imagens de Afonso são em grande escala e retratam pessoas da comunidade como a nos convidar para um tête-à-tête com elas ou, talvez, estar no salão de um grande baile, uma vez que Afonso ficou muito conhecido por registrar os bailes de soul do Aglomerado e o cenário cultural que fortalecia a identidade negra em meados dos anos 1980.

Segundo o curador, Afonso e João encontraram espaço para registrar memórias daquela população diante da desigualdade, afirmando a potência de uma memória afetiva e a imagem como um local também de escuta.

Em exposições como essa, que tem a realidade como fonte inicial, mas que mediada pela visão dos artistas se torna arte, é possível, por meio de nossas experiências e memórias, nos conectarmos com os retratados e suas vivências.

Mesmo com diferenças naturais existentes entre as realidades das pessoas, as relações humanas, as tradições, os ritos, os afazeres, as conquistas e os fracassos, as alegrias e as tristezas, os comportamentos, em geral, se moldam pelos lugares de referência, mas também pelas referências que adquirimos ao sair dos mesmos lugares.

 

Sobre a autora:

Isa Carolina é especialista em História da Arte, mediadora cultural e professora na Escola de Artes Visuais do Cefart – FCS.