Transparências e processos criativos: Marina Nazareth

O que a arte provoca? Quais sensações e pensamentos vieram ao seu encontro por meio dela?

Para a belo-horizontina Marina Nazareth, nascida em 1939, formada em direito, artista visual e professora, a arte é um convite à liberdade. É o exercício da magia, de tornar visível o que foi imaginado, “o seu modo de ser, de existir e de perceber o mundo em sua integridade (…) o seu modo de se realizar como pessoa” (OLIVEIRA, 2011).

Marina descobriu-se artista quando foi visitar uma exposição do artista plástico Alberto da Veiga Guignard no Automóvel Clube, em 1959. A artista conta que nunca se esqueceu do que sentiu naquela exposição. Segundo a artista “antes tentava colocar para fora a maluquice que havia dentro dela. Ela queria sair, mas não sabia como” (OLIVEIRA, 2011). A artista pintou seu primeiro quadro em 1963.

Atualmente, Marina coleciona mais de trinta exposições individuais no Brasil e no exterior, e possui um expressivo portfólio de trabalhos, passando por temas e técnicas variadas, tais como gravura, desenho, escultura e pintura.

Na proposta do Criarte desta semana, conversaremos sobre a técnica de transparência utilizada nas pinturas de Marina.

A transparência é uma técnica muito usada na aquarela, mas Marina a aplicou também em suas pinturas com tinta acrílica e a óleo. Observe as imagens a seguir:

Figura 1: Da série Paisagem (parte do políptico), Marina Nazareth, 2006, tinta acrílica sobre tela. Acervo da artista. Imagem: site da artista.
Figura 2: Da série Paisagem, Marina Nazareth, 2010, tinta a óleo sobre papel vegetal, sala de exposições temporárias do Museu Mineiro, 2016. Imagem: Facebook da artista.

Nesses trabalhos, a artista produziu pinturas a partir do mesmo tema, mas sobre suportes distintos. Na primeira imagem, as pinturas foram realizadas sobre telas retangulares. No detalhe do políptico apresentado (figura 1), é possível perceber algumas camadas de cores sobrepostas e também como a artista explorou a transparência da tinta acrílica sobre a tela.

 Já na segunda imagem (figura 2), observa-se pinturas que criam “camadas de tintas” em diferentes páginas de papel vegetal.  Na medida em que viramos as páginas do livro, somos apresentados a novas imagens e descobrimos as camadas de pintura em cada uma delas. Se desejarmos, podemos ver a pintura de formas diferentes: as camadas juntas, as camadas separadas, ou, ainda, fazendo composições com uma ou outra. O modo de olhar e explorar o trabalho são de escolha de quem o manuseia.

As pinturas em livros (figura 2) estiveram na exposição “Paisagem – Marina Nazareth na Galeria Mari’Stella Tristão, no Palácio das Artes, em 2011. Quem a visitou teve a oportunidade de manusear os livros de Marina Nazareth e as reações que se seguiram ao contato com a obra foram as mais diversas. Tivemos, por exemplo, uma visitante que dançou, embalada pelas imagens e pelo som de um dos trabalhos expostos, dizendo que o convite para “voar” de Marina foi aceito por ela. Na exposição era possível ler um texto da artista, que hoje está disponível em seu site e pode ser acessado clicando aqui.

Suas pinturas convidam à imersão, a “voar” pelas paisagens construídas por ela e a se atentar aos diversos planos criados nas composições.

Recentemente, Marina Nazareth escreveu um texto especialmente para o Criarte. Veja o que ela nos contou sobre o seu processo criativo:

Do Meu Processo de Criação

Marina Nazareth,

Belo Horizonte, 19/04/2021

Escolhi o caminho da arte por uma necessidade interna, que aflorou em mim com tal força que foi impossível não atendê-la. E assim tem sido desde o início da minha opção pelo exercício da arte: meu processo de criação permanece o mesmo, aprimorado pelo trabalho e amadurecimento, espero!

Hoje compreendo bem as etapas de meu processo de criação. Sei que meu trabalho trata da cor (pintura) e do traço (desenho) basicamente. Ao lado, surge a necessidade de experimentação: a razão por ter desenvolvido a série de desenhos baseados em partituras musicais foi a minha ligação afetiva com a Fundação de Educação Artística e Berenice Menegale, amiga de muitos anos que me disponibilizou várias partituras musicais modernas para visualização e estudo. Os desenhos dessa série foram interpretados por vários músicos.

O trabalho com transparências “instruções para voar” números I, II, III IV e V é composto por cinco álbuns com seis folhas de papel vegetal, com imagens que se completam formando novas imagens. Em 1973 eu ainda morava no Rio de Janeiro e fiz diversas filmagens em super-8, que era uma novidade na época. Por volta de 2010 encontrei as fitas guardadas e decidi fazer a sua edição que resultou no projeto vídeo-gráfico: “O Processo de Criação de Marina Nazareth”. São dois DVDs chamados “O Sopro do Vento” de 2015. Refiz o trabalho do desenho a cores nas areias sendo transformadas pelas ondas do mar, entre outras imagens.

Em 2012, ainda sob o impacto da morte de meu amigo Bartolomeu Campos de Queirós, realizei minha série de trabalhos inspirados em seu livro “Vermelho Amargo”. Técnica mista em papel vegetal: cores verde, amarelo e fatias de tomate. Meu último trabalho experimental, ainda em curso, trata da questão do limite que as dimensões da folha de papel impõem à criação do desenho.

Recebi de presente de meu amigo querido e grande artista Décio Noviello, pouco antes de sua morte, um álbum antigo da livraria e papelaria Oliveira e Costa, que existiu em Belo Horizonte à Praça Sete. Esse álbum, capa azul, 40 folhas de papel Kraft de 50x40cm, foi o suporte perfeito para o recorte feito em meus desenhos. Trata-se de uma série de 80 colagens de recortes e técnica mista.

Ficou curioso para conhecer um pouco mais sobre a produção de Marina Nazareth? Acesse o site da artista clicando aqui.

Ficou com vontade de explorar as transparências também? Chame a família e separe seu material: canetas marcadoras permanentes ou canetas marcadoras para vidro e dois copos descartáveis transparentes (reutilize os copos). Explore as camadas desenhando em cada copo e depois coloque um dentro do outro para ver o resultado.

Dicas: Em um dos copos, faça um desenho que servirá de “base” e, em outro, faça desenhos que complementem o primeiro quando sobrepostos. Espere a tinta das canetas secar bem antes de juntar os copos. Teste outros materiais e conte-nos como foi essa experiência!

Veja o vídeo que preparamos para inspirá-lo e crie imagens legais aí na sua casa! Não se esqueça de filmar, fotografar e compartilhar com a gente os resultados. Publique nas redes sociais usando as hashtags #educativofcs, #criarte e também @fcs.palaciodasartes no Instagram.

Vídeo sugestão de atividade, 40s. Edição, filmagem, fotos e desenhos: Nathália Bruno.

Referências:

FULGÊNCIO, Letícia. Ela Quer Romper Limites. Encontro, edição especial número 223, páginas 56-57, 2020.

MARINA Nazareth. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2021. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa9187/marina-nazareth>. Acesso em: 13 de Abr. 2021. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7

OLIVEIRA, Maria Eugênia Dias. A poética de Marina Nazareth. 2011. Disponível em: ˂http://marinanazareth.com.br/textos/˃. Acesso em: 13 de Abr. 2021.

OLIVEIRA, Maria Eugênia Dias. Marina Nazareth: fortuna crítica. Belo Horizonte: Autêntica, 2011.

Sobre a autora:

Nathália Bruno é bacharel e licenciada em Artes Plásticas, especialista em Ensino de Artes Visuais e Tecnologias Contemporâneas, artista visual, professora e mediadora cultural na Escola de Artes Visuais do Cefart – FCS.