Um par perfeito: os famosos campesinos de Grant Wood

Existem algumas obras de arte que, de tantas vezes que já foram citadas, reproduzidas, relidas ou transformadas em memes na internet, tornaram-se conhecidas, mas não são rapidamente identificadas. Uma obra que muita gente conhece porque já viu mencionada em algum lugar, mas em geral não sabe dizer quem foi seu autor, qual foi sua época e qual o seu contexto é a famosa “Gótico Americano” (1930), do artista Grant Wood.

Wood nasceu em um vilarejo em Iowa, interior dos Estados Unidos, e sempre esteve envolvido com arte. O artista passou uma temporada na Europa e teve contato com as vanguardas, o que o inspirou a produzir trabalhos com características impressionistas e pós-impressionistas, a princípio. Pôde, ainda, apreciar obras clássicas do renascimento flamengo e foram essas que o motivaram a realizar sua fase regionalista e nacionalista na qual “Gótico Americano” está inserida. O termo “regionalismo” define aspectos de uma tendência da arte norte-americana da virada do século XX, que pretendia se distanciar do modernismo europeu e do expressionismo abstrato. Artistas regionalistas possuíam uma visão romântica da vida rural em um país ainda refém da Grande Depressão de 1929.

“Gótico Americano” é considerada um símbolo da arte norte-americana da metade do século XX. É uma composição estática com cenário geometrizado, claramente inspirada na racionalidade renascentista. Composta por uma notável verticalidade que se aproxima da arquitetura gótica, com padrões de linhas verticais que se repetem nos elementos da pintura, a inspiração veio de uma casa vista pelo artista em uma viagem pelo interior. A construção, muito simples, continha uma janela neogótica ornando em contraste com a estrutura de toda a casa, tendo chamado a atenção de Wood.

Como modelos para os personagens, Wood utilizou-se de sua irmã e de seu dentista, criando figuras de feições sisudas e misteriosas. Ambas possuem pescoços e rostos alongados que acompanham toda a estrutura vertical da composição. O olhar da mulher parece alcançar algo que está além do que podemos ver e o homem nos encara com uma rabugenta intimidação, segurando uma forquilha, ferramenta típica de trabalho na zona rural. A postura introspectiva reflete as políticas nacionalistas e isolacionistas de seu país entre as duas guerras mundiais.

O artista faz, na pintura, uma reverência aos que se firmaram na terra e se mantiveram arraigados aos seus valores puritanos. Grant Wood apresentava em suas obras regionalistas um ideal da vida no campo. Suas figuras caipiras do interior americano representavam certo conservadorismo do espírito campesino que, de alguma maneira, chocava-se com os ideais de progresso e de modernidade que vinham acontecendo na arte, tanto nas grandes cidades americanas como no restante do mundo.

Referência:

FARTHING, Stephen. Tudo sobre arte. Editora Sextante.

Sobre a autora:

Isa Carolina é especialista em História da Arte, mediadora cultural e professora na Escola de Artes Visuais do Cefart – FCS.