Espetáculo “Luz e Neblina” encerra a “Retrospectiva Fellini” com Grande Teatro Cemig Palácio das Artes cheio e aclamação do público

publicado em 5 de julho 2024

A estreia do espetáculo “Luz e Neblina”, do Grupo Quatroloscinco – Teatro do Comum, encheu o Grande Teatro Cemig Palácio das Artes e impressionou o público na noite dessa quarta-feira (3/7). Com dramaturgia de Germano Melo e direção de Ricardo Alves Jr., a montagem cine-teatral encerrou a programação da “Retrospectiva Fellini”, dedicada à filmografia do célebre diretor italiano. No palco, Rejane Faria, Assis Benevenuto, Ítalo Laureano e Marcos Coletta, além de grande equipe que viabilizou as ousadas experimentações audiovisuais e a complexa movimentação de objetos e estruturas ao longo da apresentação.

Foto: Flávio Cruz

“Luz e Neblina” é livremente inspirado no clássico “Noites de Cabíria” (1957), de Fellini, e teve apresentação única e gratuita no Grande Teatro Cemig Palácio das Artes. A dramaturgia se inspira na fase neorrealista do diretor italiano – quando ele retratava a vida da classe trabalhadora no pós-guerra com profunda sensibilidade e humanismo – para tocar em uma questão contemporânea: como, em um mundo hiperconectado, saturado de imagens supérfluas e dispersivas, o fazer cênico pode ser traduzido no resgate poético da condição humana?

Além dos filmes neorrealistas, o texto faz referência a outros trabalhos do cineasta, em especial àquela que é considerada sua obra-prima, “Oito e Meio” (1963), a partir de uma mistura de elementos das linguagens teatral e cinematográfica e de constantes quebras da fronteira que separa o real do imaginado/ficcionalizado. O espetáculo se passa em meio à montagem de uma peça teatral e à gravação de um filme não-revelados para o público, ambos tendo a própria Cabíria como protagonista. A metalinguagem e, mais do que isso, hibridização midiática, contribuem para um trabalho que aproveita toda a espacialidade do teatro através da câmera. Maria Clara, de 22 anos, é estudante de cinema e veio de Santa Luzia, na região metropolitana, para assistir ao espetáculo. “Foi uma experiência muito original, bastante diferente de tudo o que eu já tinha visto. Achei incrível e me senti em casa com todas as referências ao universo cinematográfico do Fellini e ao próprio cinema, com a abordagem dos bastidores de uma filmagem e da própria mágica da câmera e da montagem. É uma junção de cinema, vida real e fantasia”, define.

A alternância de momentos naturalistas e lúdicos foi um dos grandes destaques da proposta apresenta pelo Quatroloscinco. A atmosfera do cinema de Fellini e do longa-metragem específico que norteou a escrita foi transportada para o palco através de um enredo cujo existencialismo das questões suscitadas convivia harmonicamente com a leveza de diversos momentos. Helbert Marçal, ator do Grupo Galpão que veio prestigiar a performance única, ressaltou a grandiosidade do espetáculo e a bem-sucedida combinação de entretenimento e densidade que levou o público a se divertir, mas também a permanecer com as cenas, momentos e falas vistas no decorrer da noite. “É difícil digerir uma montagem tão grandiosa, se pensarmos na forma como ela liga cinema e teatro. É um enredo bem leve, que não te deixa ver a hora passar, mas nem por isso é superficial. Muito do que é apresentado fica com você e é um convite à reflexão. Foi uma noite muito boa, e uma experiência fantástica aqui no Palácio das Artes”, conta.

Os espectadores foram surpreendidos diversas vezes ao longo da apresentação, ora pelos cenários, de um porto, uma estrada, uma casa de dança ou um quarto, ora pelos efeitos ao vivo, que reproduziam a chuva e o deslocamento de um carro na rua. A cena envolvendo o veículo (um automóvel real, colocado no centro do palco) sob a garoa foi, aliás, uma das mais bem-avaliadas pelo público, por mostrar, simultaneamente, o realismo possível através do teatro e do cinema e as estratégias usadas para iludir os espectadores. Por meio de câmeras que acompanhavam os atores, os presentes podiam acompanhar as ações sob múltiplas perspectivas, com projeções em preto-e-branco e edição ao vivo que emulavam as primeiras décadas da filmografia de Fellini. O formato impressionou a designer Gleicimar Gonçalves, que também vinha acompanhando as intervenções artísticas ao longo da “Retrospectiva Fellini”. “Foi fabuloso. Foi a primeira vez que eu vi essa configuração no palco, interligando artes cênicas e audiovisual. Os intérpretes no palco, a música, a luz e as sombras, a maravilhosa atriz principal, tudo em perfeita sintonia em um espetáculo inesquecível”, elogia.