R de Rede

Imagina que, ao visitar uma exposição, você encontre uma rede e nela uma pessoa deitada, cumprindo ali o seu horário de trabalho. Isso poderia ser uma obra de arte?

O convite que a arte faz é este: refletir e questionar. E para abrir mais possibilidades e pensar sobre o assunto, estamos criando um glossário de A-Z de objetos poéticos nas artes visuais, realizando uma curadoria de artistas e obras no contexto atual.

Bora falar de arte?

Foto: Daniela Parampal.

Na postagem anterior, conversamos sobre a letra “Q” de quadro e conhecemos um trabalho de Cinthia Marcelle, em que a artista utiliza um quadro negro para nos convidar a refletir sobre a educação e o tempo.

Hoje vamos com a letra “R” e o objeto escolhido é a rede.   

Rede

Rede são várias: rede de internet, rede de pesca, rede de contatos, rede de deitar, rede de ajuda, rede de proteção para janelas, rede telefônica, entre muitas outras. A rede é um composto de fios e nós que se entrelaçam e formam uma estrutura, de forma concreta ou invisível. Vivemos conectados por redes, somos os nós e as relações são os fios que nos entrelaçam.

As redes de dormir são peças de tecido suspensas pelas extremidades. Nelas podemos nos recostar, protegidos dos animais e da umidade do chão. É uma tecnologia criada pelos povos ameríndios e que resiste até os dias de hoje. Em nossas casas normalmente são usadas para desfrutarmos momentos de pausa.

Paulo Nazareth

Paulo Nazareth é um artista mineiro de Governador Valadares. Sua obra tem como ponto central suas origens, na África e na América. Partindo muitas vezes de suas andanças por esses continentes, ele coleta histórias em objetos, fotos, desenhos, relatos e vídeos para dar forma aos seus trabalhos.

Em Notícias de América, trabalho realizado em 2010, Paulo sai de Palmital (bairro de Santa Luzia – MG) até chegar aos Estados Unidos, a pé. Nesse caminho, de milhares de quilômetros, ele foi tecendo relações e encontros diversos entre pessoas, lugares, casos e coisas. Ao longo da jornada, coletou nos pés a poeira da América Latina até cruzar a fronteira dos EUA.

Foto: Daniela Parampal.

Trabalho (2007)

Trabalho é o nome da performance criada por Paulo em 2007 durante o programa de residência no Museu da Pampulha, em Belo Horizonte (MG). Nessa obra, um anúncio de emprego era publicado nos classificados dos jornais da cidade, oferecendo trabalho no centro cultural, com todos os direitos trabalhistas assegurados.

O selecionado batia ponto diariamente, em um expediente de 8 horas, deitado na rede e com hora de almoço garantida. A rede ficava na galeria e os visitantes encontravam o trabalhador ali, deitado e cumprindo sua jornada.

Dessa forma, Paulo desloca o conceito de trabalho e torna o sujeito deitado, o dia todo na rede, um trabalhador. Labor e ócio, folha de ponto e uma rede. Esse paradoxo é acionado na obra e nos leva a pensar sobre o ato de trabalhar e as novas formas que ele assume.

Passar o dia inteiro deitado em uma rede não foi um trabalho fácil e, durante os três meses de exposição no Museu da Pampulha, um dos funcionários abandonou o emprego.

Foto: Daniela Parampal.

Deslocar-se, deslocar ideias e coisas. Deslocar é um verbo que fala bem sobre o trabalho de Paulo Nazareth. Em 2013 e 2015, quando foi convidado a participar da Bienal de Veneza (bienal de arte mais importante do mundo), ele escolheu criar a sua própria bienal no bairro Veneza, em Ribeirão das Neves (MG). Além de expor seus trabalhos na cidade italiana, Paulo deslocou o centro da arte naquele momento para um bairro periférico em uma cidade também periférica, e apresentou ali o seu trabalho. Vale destacar que em nenhuma das vezes ele esteve fisicamente em Veneza, na Itália, pois pretende pisar em solo europeu somente depois que passar por todos os países da África.

Você conhece algum outro artista que também usou redes em suas obras? Pensou em outro objeto com a letra “R”? Conte para nós por meio das mídias sociais, usando as hashtags #borafalardearte, #educativofcs e também @fcs.palaciodasartes.

Na próxima publicação, vamos conversar sobre um objeto com a letra “S” e refletir sobre nossa relação com esse objeto, além de conhecer um artista que trabalhe com ele. O nosso convite continua aberto, bora falar de arte? Lembre-se de acompanhar as mídias sociais da Fundação Clóvis Salgado para se manter atualizado sobre a arte contemporânea!

Para curiosos:

Assista aos vídeos e performances de Paulo Nazareth aqui

Leia o conteúdo anterior, Bora falar de arte? Q de Quadro Negro

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Ilustração: Daniela Parampal.

Sobre as autoras:

Clarissa d’Errico é técnica em Comunicação Visual, bacharel e licenciada em Artes Visuais e professora na Escola de Artes Visuais do Cefart – FCS.

Daniela Parampal é bacharel e licenciada em Artes Visuais, artista visual, professora e mediadora cultural na Escola de Artes Visuais do Cefart – FCS.